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  • 19 Apr, 2025
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Outro dia eu escutei uma frase que me pegou de jeito: “Hoje, o novo analfabeto não é quem não sabe ler — é quem não sabe usar a internet.” E quanto mais eu penso nisso, mais faz sentido. A gente cresceu ouvindo que ler e escrever era suficiente pra navegar no mundo. Mas e agora? Como é que sobrevive num mundo onde todo dia aparece uma nova plataforma, onde as informações se multiplicam em segundos, e onde um clique errado pode te meter num golpe? Saber usar a internet não é mais luxo — é questão de sobrevivência.

Eu já vi gente que manda muito bem na leitura tradicional, mas se perde completamente online. Acredita em fake news, compartilha golpe de WhatsApp, cai em site de vírus achando que tá baixando boleto. E o problema não é burrice, é falta de preparo. Ninguém ensinou essa geração — e nem a anterior — a se proteger digitalmente, a questionar as fontes, a desconfiar do fácil. O analfabeto digital não é o que nunca teve acesso, mas sim o que tem acesso e não sabe o que tá fazendo com ele.

A verdade é que nunca tivemos tanta informação na mão. E, ao mesmo tempo, nunca estivemos tão desinformados. Todo mundo repassa vídeo sem checar, todo mundo acredita na manchete sem ler a matéria, todo mundo se acha jornalista de sofá. O problema é que essa facilidade criou uma falsa sensação de competência. Só porque a gente sabe mexer num app, acha que tá dominando a internet. Mas navegar sem critério é como dirigir sem saber o que significam as placas — uma hora você vai bater.

E não tô falando só dos outros, não. Eu mesmo já fui vítima da minha própria ingenuidade digital. Já acreditei em prints, já me irritei com desinformação, já compartilhei coisa que depois vi que era furada. Até entender que a internet exige leitura crítica, cabeça fria e responsabilidade. Porque agora não é só sobre entender palavras — é sobre entender contextos, intenções, e até manipulações disfarçadas de “boas intenções”.

A internet criou um fenômeno curioso: a ideia de que todo mundo é expert só porque tem um celular na mão. Já reparou nisso? Pergunta pra qualquer adolescente se ele sabe usar a internet — todos vão dizer que sim. Mas pergunta se ele sabe identificar uma URL falsa, se entende como funcionam cookies, se sabe o que é phishing... Aí o papo muda. Saber usar a internet não é só clicar rápido, é entender o que se está fazendo. E isso é algo que, sinceramente, muita gente ainda não aprendeu.

Tem adulto que se perde inteiro na hora de emitir um documento digital. Tem estudante que copia um trabalho inteiro do ChatGPT sem nem conferir o que tá ali. Tem profissional que acredita em e-mails falsos de cobrança e sai clicando em link como se fosse promoção da Black Friday. Tudo isso me mostra que o “eu sei mexer” é só fachada. No fundo, muita gente tá navegando às cegas, confiando em sorte ao invés de consciência.

E isso me preocupa porque a internet não é mais um espaço de lazer. Ela é o mundo real. É onde você paga conta, compra passagem, estuda, trabalha, ama, briga e até termina relacionamento. Se você não domina esse ambiente, você tá vulnerável. Tá exposto. E o pior: nem percebe. É como morar numa cidade gigante sem saber ler um mapa. Você pode até se virar, mas uma hora vai se perder feio.

A alfabetização digital devia ser tratada com a mesma importância que ensinar a escrever. A escola devia ensinar como identificar notícia falsa, como proteger senha, como debater com respeito nas redes. Porque hoje a internet é campo de guerra, de manipulação, de lavagem cerebral. E quem não sabe usar, vira massa de manobra. Vira vítima. Ou pior: vira cúmplice de um sistema que espalha ignorância com cara de modernidade.

Com o tempo, eu percebi que saber usar a internet direito é um ato de liberdade. Porque quem sabe usar, sabe escolher. Sabe evitar armadilhas, sabe filtrar informação, sabe tomar decisões melhores. A gente fala tanto de liberdade de expressão, mas esquece que sem alfabetização digital, não existe expressão consciente. Existe ruído. Existe confusão. E nesse caos, quem não sabe se posicionar, acaba sendo conduzido.

Hoje, quando olho pra essa enxurrada de conteúdos que surgem todo dia, fico pensando: quantas pessoas realmente param pra refletir antes de clicar, curtir ou compartilhar? Quantas questionam de onde vem aquilo, quem se beneficia com aquilo? Poucas. A maioria age por impulso, por vício. A internet virou um reflexo automático. Mas se a gente não toma o controle de volta, ela nos controla. E não é paranoia — é realidade.

O novo analfabetismo é perigoso porque ele se disfarça de modernidade. Quem olha de fora vê alguém conectado, ativo, produtivo. Mas por dentro, essa pessoa tá sendo alimentada por algoritmos, conduzida por manchetes falsas, envolvida em bolhas que só reforçam o que ela já acredita. E isso é trágico. Porque enquanto o analfabeto do passado era excluído, o de hoje nem percebe que tá sendo manipulado.

Por isso eu escrevi esse artigo. Não pra apontar o dedo, mas pra acender um alerta. Ser alfabetizado digitalmente não é um luxo nerd — é uma necessidade social. E se a gente quer um futuro mais justo, mais consciente, mais saudável… precisa começar por aí. Educar pra internet é educar pro mundo real. E quem não sabe navegar, infelizmente, continua à deriva — mesmo conectado o tempo todo.